segunda-feira, 29 de junho de 2009

Contra coronelismo eletrônico, deputadas pregam união popular

Luiza Erundina (PSB-SP), deputada desde 1999 é, aos 75 anos, uma das mais atuantes parlamentares na luta pela democratização das comunicações. Ela esteve neste domingo (28) no seminário Propostas concretas para a democratização da comunicação, do Vermelho, ao lado da deputada Manuela D’Ávila (PCdoB-RS) para debater as propostas para o setor. Erundina fez um raio-x alarmante, mas se disse otimista porque apesar de adverso, o cenário abre espaços para a maior integração entre Congresso e sociedade.


“Hoje, os deputados dão as outorgas no escuro, sem ter informações aprofundadas a respeito”, lamentou a Erundina, que na Câmara integra a Comissão de Ciência e Tecnologia e a subcomissão de Radiodifusão e preside a Subcomissão Especial de Acompanhamento da Implantação das medidas constantes no Relatório Final da Subcomissão Especial destinada a analisar mudanças nas normas de apreciação dos atos de outorga e renovação de concessão, permissão ou autorização de serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens.



Tal comportamento dos deputados, apontado por Erundina, é resultado principalmente da falta de interesse no controle das outorgas e dos veículos de comunicação, dentro da lógica do coronelato eletrônico que sempre marcou o Brasil. “O artigo 54 tem sido constantemente desrespeitado. Vinte e oito senadores têm concessões e alegam que a Constituição não deixa claras as regras. E tudo fica por isso mesmo”, explicou, citando o item da Carta que proíbe os parlamentares de firmar ou manter contrato com, entre outras, empresas concessionárias de serviço público.



Além disso, Erundina disse que a legislação sobre o assunto é “obsoleta” e, por ter faltado regulamentar esses pontos na Constituição, as brechas ficaram abertas para o uso da comunicação conforme os interesses de deputados e de empresas do setor. “Os dispositivos legais não dialogam entre si, é um caos”, enfatizou. “Não esperem que o Congresso tenha respeito e lisura com essa questão, nem com a Comissão de Ciência e Tecnologia. O governo, também, se quisesse já teria mudado essa realidade. Mas, continuamos trabalhando. A vinculação entre nossa atuação e a vida concreta da sociedade é que nos faz querer seguir adiante”, colocou, apontando a realização de mais de 20 audiências públicas da Comissão sobre comunicação.



Apesar das dificuldades, ela lembrou algumas vitórias. “Conseguimos criar a subcomissão (sobre concessões) e mudamos o ato normativo”, disse, lembrando que tal dispositivo, de 2007, pretende abrir caminho para dar maior transparência aos processos de outorga, tornando públicos dados como a quem pertence a concessão, o vencimento etc. Agora, diz, “é preciso levar esses pontos para a Conferência de Comunicação e fazer da democratização, da concessão, bandeiras reais de luta dos movimentos sociais e do povo. Alias, a Conferência veio desse acúmulo, da pressão da sociedade e o presidente (Lula) não pôde ignorá-la”.



Erundina criticou ainda o poder das grandes empresas e suas entidades representativas no jogo parlamentar. “O pessoal parece que tem pavor de enfrentar a Abert, o Evandro Guimarães (vice-presidente de Relações Institucionais das Organizações Globo), a Globo porque não quer comprar briga com um setor tão poderoso”.



A parlamentar defende a mudança no marco legal, hoje considerado insuficiente diante das mais recentes inovações tecnológicas. Ainda que tenha limitações, Erundina defende a participação de partidos e movimentos sociais na Conferência de Comunicação “para criarmos condições políticas que possibilitem essas transformações. Se soubermos aproveitar esse momento, mobilizando desde a base, podemos conquistar melhores condições para essa luta”.



De acordo com Erundina, o tema central da Conferência deve ser a exigência de uma estrutura descentralizada nas comunicações com capilaridade na sociedade, promovendo um controle social real pela base. “Hoje não há controle nenhum”, compara. Por fim, brincou, “a situação é grave hoje, mas estou otimista porque a sociedade começa a tomar conhecimento da importância desse tema para o seu dia a dia e para o país”.



Quatro bandeiras

A parlamentar comunista Manuela D’Ávila defendeu o estabelecimento de bandeiras que puxem as transformações necessárias para o setor das telecomunicações. Uma delas é a regulamentação das emendas constitucionais. “As que dizem respeito à comunicação sequer estão no rol das regulamentações deste período”, salientou. Para ela, “é preciso aglutinar os cerca de cem parlamentares do campo da esquerda porque hoje estamos divididos. Cada um acaba atuando em sua área, como sindical e juventude, por exemplo, e a atuação pela democratização da mídia acaba ficando dispersa”.



O segundo ponto que levantou foi colocar a questão das outorgas no centro das discussões do Congresso. “Sequer conseguimos hoje fazer com que os parlamentares que não estão na Comissão de Ciência e Tecnologia participem das discussões, imagine o quanto a sociedade fica de fora”. Manuela diz que a Comissão deve ser “ser transparente”, abrindo espaço também para a participação dos movimentos sociais. “Eles precisam estar presentes para pressionar e mesmo constranger aqueles parlamentares que detêm meios de comunicação”.



O aspecto seguinte defendido pela parlamentar gaúcha é a questão da tevê pública. “A sociedade deve participar desse debate para sabermos que tevê queremos. Acho que é preciso uma tevê pública que dispute espaço com as comerciais. Para isso, o suporte financeiro é fundamental”. Neste sentido, Manuela defendeu a criação de um fundo alimentado por taxas advindas das concessões. “Se as concessões são um bem público, porque não podem gerar fundos para a Empresa Brasileira de Comunicação?”, questionou. O foco central seria a criação de um sistema público de comunicação que fosse verdadeiramente democrático, amplo, diversificado e de qualidade.



Manuela também defendeu uma política nacional de rádios comunitárias “para garantir a diversidade de informação também voltada para as pequenas comunidades”. Segundo a deputada, “lutar apenas para o não fechamento das existentes é uma atuação recuada. O que os movimentos devem fazer é lutar conosco também para uma política nacional, que seria mais rapidamente aplicável do que uma envolvendo as tevês”.



Por último, colocou a relevância de se discutir os critérios de distribuição de publicidade governamental entre os meios de comunicação. “Devemos ter muita clareza e pouca ilusão sobre isso: os governos precisam anunciar nos grandes meios. Não dá hoje para ser de outra forma. Mas, é preciso que haja critérios que garantam diversidade, pluralidade e amplitude na distribuição e isso somente é possível contemplando-se um número maior de veículos. Recentemente, o governo resolveu regionalizar a verba publicitária, mas ainda não há um marco legal sobre o percentual que estabeleça onde se vai investir”.



Para Manuela, é necessário unificar os setores interessados em mudar a mídia no Brasil. “Aprendi que mobilizamos a sociedade através de bandeiras específicas. Esses quatro pontos são algumas contribuições nesse sentido. Somos pequenos diante deles e não podemos nos dividir em questões menores. Devemos trabalhar com aquilo que nos unifica”.



Também foram convidadas para a palestra a presidente da EBC, Tereza Cruvinel e o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) que, por motivos pessoais, não puderam compararecer.



De São Paulo,
Priscila Lobregatte

Fonte: Vermelho

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